domingo, 29 de junho de 2008

Reposta aos comentários de Laura Ferreira dos Santos no Público

Todos nós vemos o mundo através da lente da nossa experiência pessoal. Infelizmente, de vez em quando, isto pode causar uma distorção grave. Foi isso que aconteceu quando a Laura Ferreira dos Santos soube da campanha Laço – Sociedade Ponto Verde. Como é de esperar, a sua luta pessoal contra o cancro da mama afectou profundamente a sua maneira de ver o mundo e neste caso especifico, levou-a a uma interpretação totalmente errada dos objectivos e da mensagem desta campanha.

É interessante que a Laura Ferreira dos Santos tenha visitado o site da Sociedade Ponto Verde mas não o da Laço. Se tivesse visitado, podia ter encontrado o link para o site “Eles Também Choram” – uma iniciativa excelente do Movimento Vencer e Viver (que a Laço ajude a divulgar) para os homens à volta de mulheres que estão a lutar com o cancro da mama. Cada campanha tem a sua mensagem, o seu público – Eles Também Choram é especificamente para homens. A campanha “ 2 causas por 1 Causa” é para mulheres.

Quando a Sociedade Ponto Verde nos contactou no ano passado, aprendemos muita coisa sobre a situação da reciclagem em Portugal. Coisas que a Laura Ferreira dos Santos não se preocupou em descobrir. Primeiro, lixo não pode ser reutilizado nem reciclado. Por isso, é lixo. Por isso, a Sociedade Ponto Verde nunca utiliza a palavra “lixo”. Nem a palavra “lixo” nem o conceito de lixo fazem parte desta campanha. Se a Laura Santos Ferreira acha que esta campanha liga mulheres ao lixo, então esta ideia vem de um preconceito pessoal, consciente ou não.

Segundo, Portugal ainda não atingiu os níveis de separação e reciclagem exigidos - não só pela situação ambiental do mundo - mas mais concretamente pela imposição da União Europeia. Até agora, a Sociedade Ponto Verde apostou fortemente na educação ambiental recorrendo às crianças para fazer passar a mensagem. O público-alvo destas campanhas também eram mulheres; são elas quem toma a decisão de fazer ou não a separação dos resíduos em casa.

Terceiro, aprendemos que a ideia de fazer bem ao ambiente é motivação suficiente para provocar uma mudança de comportamentos em algumas pessoas, mas não em todas. Há quem necessite de ver os benefícios da separação da forma mais concreta e imediata.

Assim chegamos ao dilema da Sociedade Ponto Verde - separação doméstica só implica mais trabalho para a mulher da casa e não tem benefício imediato – como é que podemos motivá-la para assumir esta tarefa? Seria possível encontrar uma motivação que fosse importante para as mulheres com um beneficio concreto que pode ser realizado através dum apoio financeiro ligado à reciclagem? Sim – a detecção precoce do cancro da mama através de rastreio.

O Programa Nacional de Rastreio do Cancro da Mama só chega actualmente a pouco mais de 50% das mulheres em Portugal. E entre as mulheres que têm a sorte de viver numa zona com rastreio (gratuito, de alta qualidade e com todo o seguimento garantido), até 40% não respondem à convocação para fazer a sua mamografia. Porquê? Porque têm medo e vergonha e não percebem a importância da detecção precoce.

A Laura Ferreira dos Santos está preocupada com a sua situação pessoal mas a Laço está preocupada com as 4500 mulheres que ainda não sabem que vão ser diagnosticadas durante os próximos 12 meses com cancro da mama. Nós sabemos que, se forem todas diagnosticadas o mais cedo possível, o prognóstico para mais de 90% é muito animador. Infelizmente em Portugal ainda não conseguimos chegar a este ponto – todos os anos 1500 mulheres morrem de cancro da mama e - vamos dizer a verdade nua e crua – muitas destas mortes são desnecessárias. Acontecem porque as mulheres foram diagnosticadas tarde demais e/ou não conseguiram o tratamento ideal dentro do prazo ideal.

Campanhas de medo com estas estatísticas não levam ninguém ao médico. A Laço faz campanhas positivas com mulheres icónicas e influentes. A Laço aposta fortemente na utilização, sempre pro bono, de mulheres mediáticas para a transmissão de mensagens sobre o cancro da mama. Eu, ou a Laura Ferreira dos Santos ou uma médica especialista em cancro da mama – podemos ir todos os dias à televisão falar da importância do rastreio mas honestamente, o impacto será perto de zero.

Esperamos que pouco ao pouco, as mulheres vão adquirindo novas atitudes em relação ao cancro da mama, seguir novos hábitos em relação à sua saúde. Tal e qual como separar e reciclar, ir ao médico e fazer mamografia leva tempo e dá trabalho mas a longo prazo, são estes os gestos que nos vão salvar.

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